terça-feira, 15 de julho de 2008

Pequenos Desafios da Vida - Segundo Ato

CENA EXT. PORTÕES DA CIDADE - CONTINUANDO

Gabrielle agarra o braço de Xena.

GABRIELLE
Então eu vou te carregar.


XENA
Não há tempo para isso.
Pegue a minha espada.

Os homens se aproximam delas. Gabrielle percebe que Xena está certa, e toma a espada de Xena, virando o rosto para os atacantes que chegam, com a espada em suas mãos.

Xena agarra a vara que Gabrielle deixou caída e de alguma forma se eleva de pé, se apoiando no bastão improvisado enquanto ela puxa seu chakram. Seus nós dos dedos ficam brancos quando ela o agarra.

XENA
(continua)
Ei.

GABRIELLE
Sim, eu sei.

Gabrielle se move para mais perto de Xena, e gira suas botas na poeira quando a primeira onda de atacantes escala passando pela pilha de madeira e se dirigindo a elas.

Um cavalo sem seu cavaleiro repentinamente dá um pinote na frente, esmagando o primeiro homem e chutando um segundo. Inesperadamente, não é Argo.

Os atacantes colidem uns com os outros, ficando no caminho de seu avanço quando um homem tropeça e cai na frente deles.

VOZ
Ei!

Xena se vira, ouvindo um som atrás dela. Ela localiza um garotinho acenando.

GAROTO
Depressa! Vocês podem
se esconder conosco!

Xena cutuca as costas do corpete de Gabrielle, apontando quando ela se vira.

XENA
Vamos enquanto
temos chance.

Xena deixa voar o chakram, atingindo as duas tochas mais próximas e deixando a área na escuridão. Gabrielle coloca o braço em volta da cintura de Xena, e Xena se apóia nela enquanto realizam sua fuga.

CORTA PARA:

CENA INT. PORÃO DA ESTALAGEM - NOITE - UM POUCO DEPOIS DISSO

O porão está escuro e cheio de crianças amedrontadas. O único caminho é um alçapão de porta dupla sobre suas cabeças, o qual está grosseiramente trancado pelo lado de dentro com um trinco improvisado.

Seus olhos se alargam quando a pesada porta para o porão estala se abrindo, e duas grandes e sombrias figuras começam a descer os degraus.

Um garotinho corre diante delas, e galopa descendo os degraus dois a dois.

GAROTO
Eu as peguei! Vejam!
Elas estão aqui!

Xena se inclina contra a parede de terra enquanto Gabrielle fecha o trinco atrás delas. É evidente que ela está em grande dor. Gabrielle termina, e empresta apoio à Xena para descer o resto dos degraus.

As criança se reúnem ao pé da escada para esperar por elas.

GABRIELLE
(suavemente)
Okei, deixe-nos passar daqui.
Xena, você pode...?

XENA
Apenas continue se movendo. Eu estou bem.


GAROTO
Você estava derrotando todos aqueles
caras lá em cima! Eu vi você! Eu vi!

Xena desliza levemente no último degrau, e coloca pressão na sua perna quebrada. Ela se vira absolutamente branca, mas na frente de todas as crianças sua expressão facial nunca vacila.

XENA
Sim, você me viu.

Gabrielle ajuda Xena a subir em uma pilha de sujos sacos de cânhamo trançado e consegue fazê-la sentar neles sem forçar muito sua perna.

GABRIELLE
Deite-se, talvez eu
possa... oh, Xena.

As crianças se aglomeram em torno delas, sujas e amedrontadas, e alegres com essa distração.

GAROTO
Uau.

Mesmo na baixa luz da tocha, a lesão parece horrenda. Gabrielle se senta um pouco, não muito certa de por onde começar.

GAROTO
(continua)
Isso dói?


Xena olha para o garoto. Ela encolhe os ombros.

XENA
Nah. Na verdade não.

Uma das outras crianças, uma garota mais velha, vem à frente.

GAROTA
Minha mãe nos mandou todos aqui pra dentro.
Ela disse para não sairmos,
mas Ziggy nunca escuta.

Gabrielle desamarrou a bota de Xena, e retirou sua armadura de joelho, agora, meio perdida, ela olha para cima, para Xena.

XENA
Você é Ziggy?

Xena aponta para o garoto. Ele sorri.

XENA
(continua)
Ótimo. Vocês têm alguma
água aqui embaixo?

GAROTA
Bem ali! Quer um pouco?
Você está com sede?

ZIGGY
Ei, sua tola! Se ela estivesse com sede,
nós pegaríamos cerveja! Ninguém bebe
*água* ao menos que seja obrigado!

GAROTA
(preocupada)
Eu devo ir chamar minha mãe?

Xena e Gabrielle trocam olhares.

GABRIELLE
Não. Melhor vocês ficarem aqui, como
ela disse. Mas nós poderíamos
realmente usar essa água.

As crianças todas correm até uma tina encostada na parede do porão, e agarram baldes em uma massa bagunçada de avidez juvenil.

Xena e Gabrielle simplesmente olham uma para a outra em silêncio por um momento.


GABRIELLE
(continua)
Não era para você ter sido ferida.
Essa não é uma espécie de regra?

Xena sorri fracamente. Então seu sorriso desvanece.

XENA
Nós teremos que ajustar isso.

GABRIELLE
(silenciosamente)
Eu sei.

Ela olha para trás.

GABRIELLE
(continua)
Essas crianças. Elas estão tão amedrontadas,
e aqueles assassinos lá em cima....

Xena coloca a mão no joelho de Gabrielle. As crianças voltam, carregando um grande balde de água pingando entre elas.

XENA
Uma coisa de cada vez. Lave isto bem,
depois puxe minha perna pra endireitá-la.

Um estampido faz elas todas pularem e olharem para cima. Elas ouvem gritos zangados, mas não podem distinguir as palavras.

XENA
(continua)
(severamente)
Melhor se apressar.

Gabrielle pega o balde e respira fundo.

GABRIELLE
Você sabe que isso vai doer
mais em mim do que em você.


XENA
(calorosamente)
Vá em frente. Apenas faça.

Gabrielle inclina o balde e começa a despejar. Do seu lado, fora da vista das crianças, as mãos de Xena se apertam em torno de um pedaço de lenha tão firmemente que ele range.

DESVANECE PARA:

CENA INT. PORÃO - NÃO MUITO DEPOIS

Xena está agora deitada estirada nos sacos. Sua espada está pousada em sua mão, semi-escondida na palha do chão.

Gabrielle está enrolando uma bandagem em volta do joelho de Xena, que está sendo segurado reto por várias talas. As crianças estão sentadas em volta, de olhos arregalados.

ZIGGY
Uau! Meu pai grita quando ele puxa uma
lasca pra fora. Você é impressionante!

Xena lhe lança um olhar. Ela levanta sua mão direita e a examina. Há várias lascas enterradas na palma, da madeira em que ela estava se agarrando. Com um balanço de cabeça, ela deixa a mão cair.

GABRIELLE
Tudo bem. É o melhor que posso fazer.

Xena inspeciona o resultado. Sua perna está envolta por uma firme bandagem do meio da coxa até o meio da panturrilha.

XENA
Bom trabalho.

GAROTA
Aqueles piratas são apenas uns covardes.
Se meu pai estivesse aqui, puxa,
eles sairiam correndo!

ZIGGY
Sim! O meu também!

As outras crianças concordam em um coro. Gabrielle vira o rosto para elas.

GABRIELLE
Onde estão seus pais? Eu não vi
nenhum dos homem de vocês...
quando estávamos lá fora.

ZIGGY
Eles todos desceram o rio até
a casa do príncipe. Eles vão
nos trazer brinquedos na volta!

Gabrielle parece confusa.

GABRIELLE
Todos eles? Quer dizer que todos
os pais de vocês foram embora?

As crianças todas assentem a ela. Do lado de fora, os barulhos em sua maioria desvaneceram, mas o som da batida de cascos ainda é ouvido.

XENA
Quando eles partiram? Eu vi os homens
todos por aqui quando chegamos.


GAROTA
Esta noite. Quando ficou escuro.
Eles levaram todas as carroças também.

XENA
(para Gabrielle, suavemente)
Eles devem ter levado a colheita para
o mercado. Você pode alcançá-los.

GABRIELLE
(sussurrando)
Alcançá-los?

XENA
(insistentemente)
Se você partir agora, você pode chegar até
eles ao nascer do sol e trazê-los de volta...
Não se sabe quanto tempo esses filhos
da mãe vão ficar aí fora, Gabrielle.

Gabrielle não está satisfeita, mas ela também percebe que Xena está certa.

GABRIELLE
Eu não quero te deixar aqui.


Xena olha para as crianças, depois olha para Gabrielle. Ela levanta ambas as sobrancelhas.

XENA
Eu adoraria correr bem junto a você.

Ela toca a perna.

XENA
(continua)
Mas não posso. Vá em frente. Quanto mais
rápido você for, mais rápido você volta.

ZIGGY
Você vai buscar o meu
pai? Posso ir?

Gabrielle toma a mão de Xena e a aperta. Ela olha para Ziggy.

GABRIELLE
Bem, eu gostaria da companhia, mas... Eu me
sentiria muito melhor se um belo cara forte
como você ficasse aqui para cuidar da
minha amiga enquanto eu estiver fora.

Xena lança um olhar em Gabrielle que poderia coalhar o leite ainda dentro da cabra. Ziggy certamente se ilumina.

ZIGGY
Eu posso fazer isso!

GABRIELLE
(gentilmente)
Obrigada. Eu realmente fico grata por isso.

Gabrielle se vira para Xena.

XENA
Oohhh... Você vai me
pagar por isso.


GABRIELLE
(sorrindo)
Promessas, promessas.

Gabrielle se levanta e limpa a poeira dos joelhos. Ela está claramente relutante de partir, mas ela assenta seus sais no lugar e vai reaver o bastão que Xena tinha tomado dela.

XENA
Quer levar isso no lugar?

Xena aponta para a espada, depois dá um tapinha no bastão.

XENA
(continua)
Eu posso precisar disto.

Gabrielle hesita, depois balança a cabeça.

GABRIELLE
Eu vou encontrar outro quando
estiver de fora dos portões.
Você seja boazinha, ok?

XENA
Eu, boazinha? Nunca. Vá.


Gabrielle se vira para ir, depois pára e volta para o lado de Xena, se ajoelhando perto dela e colocando seu corpo entre os olhares curiosos das crianças e sua parceira.

Xena segura sua fanfarronice por um momento mais, depois percebe o que Gabrielle fez e relaxa, deixando sua cabeça descansar no ombro de Gabrielle enquanto ela brevemente permite a dor se mostrar em seu rosto.


Tão brevemente quanto, Gabrielle envolve o rosto de Xena com a mão, e lhe dá um beijo na cabeça.

Então elas se separam e, enquanto Gabrielle se levanta, Xena se puxa para cima nos sacos e coloca a espada sobre as coxas.

GABRIELLE
Vocês caras apenas fiquem aqui, e eu
voltarei tão logo eu possa, com seus
parentes, okei? Não saiam daqui.

CRIANÇAS
Okei.

Com um último olhar para trás, Gabrielle caminha cuidadosamente subindo as escadas e destrava o trinco, puxando-o cuidadosamente aberto só um pouco e espiando para fora. Depois de um momento, ela se satisfaz, e abre a tranca inteiramente, deslizando para fora e fechando a porta atrás dela.

As crianças param, com os olhos fixos na porta, depois lentamente elas movem suas cabeças e focalizam Xena.

Xena olha de volta para elas.

As crianças todas correm e se reúnem em volta de Xena em um círculo apertado.

O olhar de Xena se alarga levemente, em alarme.


XENA
Querem alguma coisa?

Eles todos olham para Ziggy, seu líder de bagunça.

ZIGGY
Você é um soldado romano?

CORTA PARA:

CENA EXT. PORTÕES DA CIDADE - NOITE - AO MESMO TEMPO

Gabrielle desliza ao longo da beirada do muro da cidade, ficando o máximo nas sombras quanto possível. Ainda há atacantes cavalgando por ali, embora a maioria dos habitantes pareça ter escapado, ou então estão mortos ou feridos. A estalagem é uma fonte de altos barulhos, e pela cantoria é evidente que os atacantes encontraram os suprimentos de cerveja.

GABRIELLE
Espero que tenham encontrado toda a cerveja.
Isso torna meu trabalho mais fácil.


Gabrielle vê vários atacantes caminharem passando os portões, depois ficarem parados perto da beira do caminho que leva à estalagem. Ela aproveita a oportunidade para deixar as sombras, deslizando entre os portões antes que alguém a veja.

Gabrielle pára do lado de fora dos portões para ouvir, então ela começa a descer a estrada, satisfeita de não ter sido vista.

CORTA PARA:

CENA EXT - PORTÕES DA CIDADE - UM POUCO DEPOIS DISSO

O líder dos atacantes e seu segundo no comando ficam conversando.

SEGUNDO HOMEM
Chefe, isso foi fácil demais.

CHEFE
Um pedaço de doce, como eu te disse. Agora
vamos fechar aqueles portões e ver se há
alguém sóbrio o bastante para guardá-los.

SEGUNDO HOMEM
Você acha que alguém vai
voltar aqui esta noite?

O chefe olha em volta.

CHEFE
Nunca se sabe. Aquela mulher
pode aparecer novamente.

SEGUNDO HOMEM
(rindo)
Sem chance! Provavelmente está morta agora.
Rastejou pra fora depois que a surramos.

O chefe parece duvidoso, mas dá de ombros.

CHEFE
Talvez. Apenas feche os portões!

O segundo homem e alguns outros correm até os portões, e os fecham. Eles marcham até as barras de trancar, as levantam com assobios contentes e as atiram no lugar.

O chefe observa, satisfeito.

CHEFE
(continua)
É isso. Este lugar agora é nosso!
Qualquer um que o quiser, terá
que morrer por isso!

Os homens todos riem.

CORTA PARA:

CENA EXT. ESTRADA DA FLORESTA - NOITE


Gabrielle se afasta da cidade correndo. A lua lentamente se ergue entre as árvores, iluminando seu caminho e atirando sua sombra longe descendo pela estrada à frente dela.


FADE OUT.

FIM DO SEGUNDO ATO

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